Frase do dia
Related Posts with Thumbnails

quarta-feira, 30 de maio de 2012

A força do perdão

Quantas vezes evitamos propagar as nuances de beleza na personalidade daqueles que, na verdade, tantas vezes carregam consigo fardos inacessíveis aos nossos olhos?

Todos nós caminhamos em estradas evolutivas muito particulares, e muitas vezes insondáveis ao contato daqueles que nos cercam. Mesmo assim, não raro nos precipitamos em atitudes impulsivas, procurando de alguma forma a condenação dos que caminham ao nosso lado, por seguirem condutas tão diferentes das nossas nas ramificações desta árvore que se chama Vida. E, dia a dia, acumulamos em nossa personalidade, por invigilância moral, o atraso de vida proporcional à essência perdida nas oportunidades de amor das circunstâncias diárias.

A mão pesada que colocamos em julgamento, geralmente agride nossa própria existência em intrigas que dilaceram o próprio coração. Perdoar, ao contrário, engrandece, incentiva ambos os lados à esperança e trabalho no bem comum. Desculpar, portanto, é retórica preciosa e oportuna do tempo presente, onde podemos escolher o crescimento interior como estrada de infinita grandeza em nossas vidas.

Enquanto somos impulsionados a incontáveis acusações maliciosas e desordenadas, pelo vício de comportamento, as horas se perdem nos labirintos que forjamos ao redor de nossos próprios corações, e enquanto a maledicência encontrar espaço em nossas vidas, o perdão continuará sufocado dentro de nós.

Porém, entre tantos descasos de nós mesmos com relação à nossa própria conduta, chega um dia em que faz-se necessário o progresso em nossas atitudes, capaz de despertar a humanidade de sua infância moral, abrindo portas a um renovado estágio de evolução.

Então, quando a boa vontade atingir em nós a prioridade das ações, e os impulsos egoístas forem domados com a mansidão e paciência de quem constrói uma grande fortaleza... Ou quando os pequenos e silenciosos gestos de nossa relutante bondade alcançarem os aflitos que já se perderam nas próprias chagas da ignorância... Quando, em tortuosas lutas internas, invisíveis a olhares cobertos de orgulho e vaidade, doarmos o sorriso e o abraço ao indigente moral perdido também nos pesados desafios da vida... Quando, talvez, finalmente, priorizarmos o cuidado e o respeito àqueles que nos cercam diariamente, em detrimento de nossos próprios caprichos... Nesse dia tão distante, mas tão almejado, não mais nos sentiremos capazes de exigir e constranger os outros a um pedido de desculpas, ou mesmo não nos sentiremos tão ofendidos por mágoa qualquer. A ofensa, que antes nos feria, agora adormecerá nos braços incondicionais do amor e da compreensão, na certeza de que todos, sem exceção, caminhamos palmo a palmo, migalha a migalha, nas estradas do autoconhecimento e da perfeição moral que nos tornam semelhantes na condição humana.

segunda-feira, 28 de maio de 2012

Conto Chinês

Disse o sábio:

Meu filho, amar é uma decisão, não um sentimento. Amar é dedicação. Amar é um verbo e o fruto desta ação é o amor. O amor é um exercício de jardinagem.
Arranque o que faz mal, prepare o terreno, semeie, seja paciente, regue e cuide. Esteja preparado por que haverá pragas, secas ou excesso de chuvas, mas nem por isso abandone o seu jardim. Ame, ou seja, aceite, valorize, respeite, dê afeto, ternura, admire e compreenda. Simplesmente; Ame! A vida sem AMOR

...não tem sentido.

A inteligência sem amor te faz perverso.
A justiça sem amor te faz implacável.
A diplomacia sem amor te faz hipócrita.
O êxito sem amor te faz arrogante.
A riqueza sem amor te faz avarento.
A docilidade sem amor te faz servil.
A pobreza sem amor te faz orgulhoso.
A beleza sem amor te faz ridículo.
A autoridade sem amor te faz tirano.
O trabalho sem amor te faz escravo.
A simplicidade sem amor te deprecia.
A lei sem amor te escraviza.
A política sem amor te deixa egoísta.
A vida sem AMOR... não tem sentido.

 Pe. Marcelo Rossi
do livro Ágape

sábado, 26 de maio de 2012

Para reflexão...


(Qualquer semelhança é mera coincidência, ou não!) 


Dizem que, se você colocar um sapo em uma panela de água fervendo ele pula fora e salva a sua própria vida. Mas, se você colocá-lo em uma panela de água fria e for esquentando a água aos poucos, ele não percebe a mudança da temperatura e morre cozido. Por que o sapo não pula quando a água começa a se esquentar? Vamos analisar o que deve acontecer ao sapo e tentar entender:


28° - Humm... Que água gostosa!
32° - É, a água está boazinha...
36° - Essa água está ficando sem graça, será que está mudando? Bobagem, por que a água mudaria? Deve ser impressão minha...
38° - Estou ficando com calor, a água está me incomodando. Mas, é só um pouquinho.
39° - É, está quente mesmo. É melhor nadar em círculo que ela já esfria.
40° - A água está ficando quente mesmo. Vou procurar um cantinho mais fresco, até a quentura passar.
42° - Realmente a água está péssima. Está quente de verdade. Está ruim aqui. Vou procurar alguém que possa resolver isso.  Eu poderia até tomar providencias, mas, quem esquentou a água é quem deve resolver agora. É melhor eu esperar mais  um pouquinho.
43° - Meu Deus! Será que eu é que tenho que resolver isso? Ninguém vê que está me incomodando? Já reclamei, falei mal e ninguém toma uma atitude? 
44° - Agora perdi a paciência... Se não vierem resolver, eu vou procurar fazer um escândalo e terão que se  responsabilizar por mim.
45° - Eu deveria ter pulado fora da água quente, enquanto tinha forças, agora me sinto fraco e não consigo mais. Não poderia ter esperado durante tanto tempo... 
48° - Sapo morto!  O pensamento do sapo serve para ilustrar como, às vezes, enfrentamos as dificuldades em nossa vida. Quantos de nós, não paramos para perceber que em torno, a vida pulsa nos mostrando o milagre da criação Divina.


Continuamos insistindo para viver de acordo com situações que estão fora de nosso controle, que nós mesmos criamos,  perdendo oportunidades de fazer mudanças reais em nossa vida. Temos 'medos' que não conseguimos vencer, dificuldades que não dimensionamos e nos acomodamos em situações que não trarão nenhum proveito ao nosso aperfeiçoamento espiritual, mas, pela facilidade e pelo conhecimento que estes fatos nos proporcionam, perdemos dessa maneira, a oportunidade de começar a trabalhar a nossa reforma íntima.

terça-feira, 22 de maio de 2012

Um siri vai lhe trazer alegria

Sempre que o mundo desabava sobre minha cabeça, eu ia andar pela praia, próxima de onde morava.

Um dia encontrei uma bela garotinha de olhos tão azuis quanto o mar, construindo um castelo de areia ou algo parecido.

Oi, disse ela.

Eu respondi com um aceno de cabeça, não estava com humor para me aborrecer com uma criança.

Você quer me ajudar a construir meu castelo?

Hoje não. Falei pouco atencioso.

Eu gosto de sentir a areia em meus dedos do pé, ela falou sorridente.

Que boa idéia, pensei, e tirei meus sapatos. Um siri deslizou próximo.

Isto é um "alegria", falou a criança.

É um o quê?, perguntei.

Isto é um "alegria", livre pela praia.

Adeus "alegria", olá dor, murmurei comigo mesmo e continuei a caminhar.

Eu estava deprimido, mas a menina não desistia e perguntou: qual é o seu nome?

Eu sou Robert Peterson, respondi..

O meu é Wendy... Eu tenho seis anos.

Oi, Wendy.

Apesar de minha melancolia fui obrigado a rir e continuei caminhando.

Sua risadinha musical me seguiu.

Venha novamente, Sr. P., disse ela, animada.

Nós teremos outro dia feliz.

Meus dias foram atribulados e somente semanas depois é que voltei à praia.

A brisa era fria, mas eu andava a passos largos, tentando readquirir serenidade.

Tinha até me esquecido da criança, quando ela apareceu.

Oi, Sr. P., você quer brincar?

Não sei, que tal charadas? Perguntei sarcasticamente.

Eu não sei o que é isto, falou a menina.

Então me deixe continuar a caminhada.

Onde você mora? Perguntei-lhe.

Ali. Ela respondeu apontando na direção de uma fila de cabanas de verão.

Como você vai para a escola?

Eu não vou à escola. A mamãe disse que nós estamos de férias.

Ela tagarelou e quando eu ia voltar para casa, Wendy disse que tinha sido outro dia feliz. E havia sido mesmo.

Três semanas mais tarde, eu andava apressado pela praia, quase em pânico, quando a garota me alcançou.

Olhe, se você não se importa, hoje eu quero andar sozinho.

Ela me pareceu pálida e sem fôlego.

Por que?, ela perguntou.

Porque minha mãe morreu! Gritei.

Oh, então este é um dia ruim, falou a menina com ar de tristeza.

Sim, eu disse, e ontem e anteontem também. Vá embora!

Um mês depois disto, fui andar novamente na praia, mas ela não estava lá.

Sentindo-me culpado e admitindo para mim mesmo que sentia falta dela, subi até à cabana, e bati na porta.

Uma mulher jovem atendeu.

Olá, eu sou Robert Peterson.

Senti a falta de sua pequena menina e gostaria de saber se ela está bem.

Oh, sim, Sr. Peterson, entre, por favor.

Wendy falou muito do Senhor.

Eu tinha receio que ela estivesse lhe aborrecendo.

Se ela foi um incômodo, por favor, aceite minhas desculpas.

Não, sua filha é uma criança muito amável. Onde está ela?

Wendy morreu na semana passada, Sr. Peterson. Ela tinha leucemia. Talvez não tenha lhe contado...

A notícia me deixou cego e mudo, por alguns instantes...

E a mãe continuou: ela adorava esta praia e parecia um tanto melhor aqui. Aqui teve muito do que ela chamava de "dias felizes".

Mas nos últimos dias, ela piorou rapidamente...

Minha filha deixou algo para o Senhor.

Entregou-me um envelope, com Sr. "P." escrito em grandes letras infantis.

Dentro havia um desenho uma praia amarela, um mar azul, e um siri marrom. Embaixo estava escrito: "Um siri vai lhe trazer alegria."

Lágrimas rolaram de meus olhos, e um coração que quase esqueceu de amar abriu-se largamente.

Tomei a mãe de Wendy em meus braços e murmurei repetidas vezes: eu sinto muito, sinto muito!

O pequeno e precioso desenho está agora emoldurado e pendurado em meu escritório.

Seis palavras uma para cada ano de sua vida me falam de harmonia, coragem, amor e desinteresse.

História traduzida por Sérgio Barros
autoria desconhecida.

domingo, 20 de maio de 2012

Nosso valor

Um famoso palestrante começou um seminário numa sala com 200 pessoas, segurando uma nota de R$100,00.
Ele perguntou. Quem de vocês quer esta nota de R$100,00?
Todos ergueram a mão.
Então ele disse. Darei esta nota a um de vocês esta noite mas, primeiro, deixem-me fazer isto. Então, ele amassou totalmente a nota e perguntou outra vez. Quem ainda quer esta nota? E continuou. E se eu fizer isso, deixou a nota cair ao chão, começou a pisá-la e esfregá-la. Depois, pegou a nota, agora já imunda e amassada e perguntou. E agora? Quem ainda vai querer esta nota de R$100,00? Todas as mãos voltaram a se erguer.
O palestrante voltou-se para a platéia e disse que lhes explicaria o seguinte. Não importa o que eu faça com o dinheiro, vocês continuarão a querer esta nota, porque ela não perde o valor. Esta situação também acontece conosco. Muitas vezes, em nossas vidas, somos amassados, pisoteados e ficamos nos sentindo sem importância. Mas, não importa, jamais perderemos o nosso valor. Sujos ou limpos, amassados ou inteiros, magros ou gordos, altos ou baixos, nada disso importa! Nada disso altera a importância que temos! O preço de nossas vidas, não é pelo que aparentamos ser, mas, pelo que fizemos e sabemos.

quinta-feira, 17 de maio de 2012

E os velhos se apaixonarão de novo…

Meu amigo não chegou na hora marcada. Telefonou dizendo que estava num velório. Chegou atrasado, sorridente. E me contou que fora no velório que lhe viera aquela felicidade. Pensei logo que o morto deveria ser seu inimigo. Não era. Um tio, muito querido, pessoa doce, 82 anos. E ele me contou uma história de um amor… Parece que seu velho corpo não suportara a intensidade da felicidade tardia, e os seus músculos não deram conta do jovem que, repentinamente, dele se apossara.

O amor surgira no tempo em que ele é mais puro: a adolescência. Mas naqueles tempos havia uma outra AIDS, chamada tuberculose, que se comprazia em atacar as pessoas bonitas, os artistas, os apaixonados — esses eram os grupos de risco. Pois ela, a tuberculose, invejosa da felicidade dos dois, alojou-se nos pulmões do moço, que teve de ir em busca de ar puro, no alto das montanhas, sanatório, tal como Thomas Mann descreve em seu livro — ”A montanha mágica”. Quem ia para tais lugares despedia-se com um “adeus”, um olhar de “nunca mais”. Na melhor das hipóteses, muitos anos haveriam de passar antes do reencontro.

Imagino o sofrimento da jovem dividida: o corpo, naquela casa, a alma por longe terra! Na vida daquela menina, que surda, perdida guerra… (Cecília Meireles).

Valeram mais os prudentes conselhos da mãe e do pai: não trocar o certo pelo duvidoso. Vale mais um negociante vivo que um tuberculoso morto. E aconteceu com ela o que aconteceu com a Firmina Dazza, que de longe e às escondidas namorava o Fiorentino Ariza, na estória de Gabriel García Márquez Amor nos tempos da cólera, que foi obrigada pelo pai a se casar com o doutor Urbino: não se troca um médico por um escriturário. Casou e com ele ficou até que, depois de 51 anos, veio a libertação… Como também o foi o amor de T.S. Eliot e Valerie. Todos eles amores de velhice…

Amor de mocidade é bonito, mas não é de espantar. Jovem tem mesmo é que se apaixonar. Romeu e Julieta são aquilo que todo mundo considera normal. Mas o amor na velhice é um espanto, pois nos revela que o coração não envelhece jamais. Pode até morrer, mas morre jovem. “O amor retribuído sempre rejuvenesce”, dizia Eliot, no vigor de sua paixão, aos 70 anos…

A história que meu amigo contou era parecida com a do Florentino e da Firmina. Só que a espera foi muito maior. Amor de adolescência interrompido – cada um seguindo seu caminho, diferentes, outros amores, famílias. Mas o tempo não consegue apagar. A psicanálise acredita que no inconsciente não há tempo… Somos eternamente jovens.

Ela casou. Ele casou. Nunca mais se viram. Quando ele tinha 76 anos, ficou viúvo. Quando ela tinha 76 anos (ele tinha 79), ela ficou viúva. E ficou sabendo que ele estava vivo. A curiosidade e a saudade foram fortes demais. Foi procurá-lo. Encontraram-se. E, de repente, eram namorados adolescentes de novo. Resolveram casar-se.

Os filhos protestaram. Eles, os filhos, todos os filhos, não suportam a idéia de que os velhos também têm sexo. Especialmente os pais. Pais velhos devem ser fofos, devem saber contar histórias, devem tomar conta dos netos. Mas velho apaixonado é coisa ridícula. Não combina. Mais detalhes no livro da Simone de Beauvoir sobre a velhice. E houve também aquela história do programa Você decide: o velho pai, infeliz a vida inteira com a esposa, encontra uma mulher por quem se apaixona. A pergunta: ele deve ou não deve deixar a esposa para viver o novo amor? Você decide… A decisão do público — os filhos, evidentemente: “Não, ele não deve viver o novo amor…” Os filhos sempre decidem contra o amor dos pais. Mas, na nossa história, os dois velhos deram uma solene banana para os filhos e foram viver juntos em Poços de Caldas.

E de repente, já no crepúsculo, as arvores que todos julgavam secas começam a soltar brotos, florescem. Viveram um ano de amor maravilhoso, e ele até começou a escrever poesia e voltou a tocar o violino que ficara por mais de 50 anos sobre um guarda roupa, porque a esposa não gostava de música de violino. Reaprendeu as antigas palavras de amor. Confessou ao sobrinho: “Se Deus me der dois anos de vida com esta mulher, minha vida terá valido a pena…” Bem que Deus quis. Mas o corpo não deixou. Não teve dois anos, teve um… E eu fiquei pensando que esse um ano pode ter sido semelhante àquelas experiências raras que a gente tem, e que fazem brotar, do fundo da alma, aquele grito de exultação, a la Zorba: "Valeu a pena o Universo ter sido criado, só por causa disto!"

E foi o mesmo que aconteceu com T.S.Eliot, que só encontrou o seu amor aos 68 anos, e aos 70 anos dizia que, antes do casamento, estava ficando velho. Mas agora se sentia mais jovem do que quando tinha 60.

O amor tem esse poder mágico de fazer o tempo correr ao contrário. O que envelhece não é o tempo. É a rotina, o enfado, a incapacidade de se comover ante o sorriso de uma mulher ou de um homem. Mas será incapacidade mesmo? Ou será uma outra coisa: que a sociedade inteira ensina aos velhos que o tempo do amor passou, que o preço de serem amados por seus filhos e netos é a renuncia aos seus sonhos de amor? Morreu de amor, como temia o Vinícius.

Compreendi a felicidade do meu amigo. E também fiquei feliz. Aquele velório foi como o acorde que se toca ao fim de uma sonata: a culminância da felicidade. Interessante que, como regra, o movimento final das sonatas é um allegro. Para trás dos adágios lamentosos! A conclusão deve ser um orgasmo de alegria. E se eu pudesse, acrescentaria aos textos sagrados, nos lugares onde os profetas tem visões de felicidade messiânica, esta outra visão que eu penso até o próprio Deus aprovaria com um sorriso: “E os velhos se apaixonarão de novo…”

Começa aqui o novo final para a história. Passaram-se semanas. Eram dez horas. Eu estava trabalhando no meu escritório. O telefone tocou. Voz aveludada de mulher do outro lado.

— É o professor Rubem Alves?

— Sim, respondi secamente. Eu sou sempre seco ao telefone.

— Quero agradecer a belíssima crônica que o senhor escreveu com o título: ” …e os velhos se apaixonarão de novo”. O senhor já deve ter adivinhado quem está falando….

— Não, respondi. Por vezes eu sou meio burro. Aí ela se revelou:

— Sou a viúva.

Foi o início de uma deliciosa conversa de mais de 40 minutos, interurbano, em que ela contou detalhes que eu desconhecia. O medo que ela teve quando ele resolveu mandar consertar o violino! Ela temia que os dedos dele já estivessem duros demais… Ah! Que metáfora fascinante para um psicanalista sensível! Sim, sim! Nem os violinos ficam velhos demais, nem os dedos ficam impotentes para produzir música! E aí foi contando, contando, revivendo, sorrindo, chorando — tanta alegria, tanta saudade, uma eternidade inteira num grão de areia… Ao terminar, ela fez esta observação maravilhosa:

— Pois é, professor. Na idade da gente, a gente não mexe muito com sexo. A gente vive de ternura!

O que me fez lembrar a observação de Kundera sobre a necessidade “de salvar o amor da tolice da sexualidade”. A sexualidade pertence à ordem da poesia. Abelardo e Heloisa se amaram até a morte.
 
© Rubem Alves

domingo, 13 de maio de 2012

O mundo não é maternal

É bom ter mãe quando se é criança, e também é bom quando se é adulto. Quando se é adolescente pensa que viveria melhor sem ela, mas é erro de cálculo. Mãe é bom em qualquer idade.
Sem ela, ficamos órfãos de tudo, já que o mundo lá fora não é nem um pouco maternal conosco.

O mundo não se importa se estamos desagasalhados e passando fome. Não liga se virarmos a noite na rua, não dá a mínima se estamos acompanhados por maus elementos. O mundo quer defender o seu, não o nosso. O mundo quer que a gente fique horas no telefone, torrando dinheiro. Quer que a gente case logo e compre um apartamento que vai nos deixar endividado por 20 anos. O mundo quer que a gente ande na moda, que a gente troque de carro, que a gente tenha boa aparência, e estoure o cartão de crédito.

Mãe também quer que a gente tenha boa aparência, mas está mais preocupada com o nosso banho, com os nossos dentes e nossos ouvidos, com a nossa limpeza interna: não quer que a gente se drogue, que a gente fume, que a gente beba.

O mundo nos olha superficialmente. Não consegue enxergar através.
Não detecta nossa tristeza, nosso queixo que treme, nosso abatimento.
O mundo quer que sejamos lindos, sarados e vitoriosos, para enfeitar ele próprio, como se fôssemos objetos de decoração do planeta.
O mundo não tira nossa febre, não penteia nosso cabelo, não oferece um pedaço de bolo feito em casa. O mundo quer nosso voto mas não quer atender nossas necessidades. O mundo, quando não concorda com a gente, nos pune, nos rotula, nos exclui. O mundo não tem doçura, não tem paciência, não pára para nos ouvir. O mundo pergunta quantos eletrodomésticos temos em casa e qual é o nosso grau de instrução, mas não sabe nada dos nossos medos de infância, das nossas notas no colégio, de como foi duro arranjar o primeiro emprego. Para o mundo, quem menos corre, voa. Quem não se comunica se trumbica. Quem com ferro fere, com ferro será ferido.
O mundo não quer saber de indivíduos, e sim de slogans e estatísticas…

Mãe é de outro mundo. É emocionalmente incorreta: exclusivista, parcial, metida, brigona, insistente, dramática, chega a ser até corruptível se oferecermos em troca alguma atenção. Mãe sofre no lugar da gente, se preocupa com detalhes e tenta adivinhar todas as nossas vontades.

Enquanto que o mundo propriamente dito exige eficiência máxima, seleciona os mais bem dotados e cobra caro pelo seu tempo. Mãe é de graça!

© Martha Medeiros